O texto abaixo, bem como os documentos nele apresentados, pretende mostrar as incoerências apresentadas pela gestão da Universidade Federal de Uberlândia no que diz respeito às questões raciais e casos de racismo que ocorreram na instituição ao longo do ano de 2023, até o presente momento, no início do semestre letivo 2023/01. Para contextualizar os apontamentos e denúncias que serão aqui publicados, trazemos breves relatos a cerca de acontecimentos na universidade, revelando a postura da gestão da universidade, que acaba por corroborar com o racismo incutido nas instituições do Estado, como elucidado pelo Ministro Silvio de Almeida em sua literatura, vulnerabilizando as pessoas negras que constituem a UFU.
No mês de março do corrente ano, quando se iniciava um semestre letivo na universidade (semestre 2022/02), vieram à tona dois casos de racismo na Universidade Federal de Uberlândia: nos campi Ituiutaba – contra um aluno do curso de História – e Umuarama – contra um grupo de alunos do curso de Psicologia. Na imediata ciência dos casos, o SINTET-UFU, o Diretório Acadêmico da Psicologia (DAPSI) e o DCE-UFU, sob a gestão da chapa Esperançar, emitiram notas de repúdio como forma de denúncia pública dos fatos, o que ocorreu no dia 02 de março de 2023 (quinta-feira). Uma vez evidenciados, o canal de notícias G1 publicou no dia 03 de março (sexta-feira), uma matéria que expunha abertamente a narrativa dos fatos, bem como a nota emitida pelo SINTET-UFU na íntegra, relatos do DCE-UFU e trechos do posicionamento do DAPSI, bem como uma resposta da assessoria de imprensa da universidade ao canal de notícias: CLIQUE AQUI E LEIA A NOTÍCIA DO G1 NA ÍNTEGRA
No dia 05 de março (domingo), a pró-reitora da PROAE (Pró-Reitoria de Assistência Estudantil) enviou mensagem pelo WhatsApp a uma das alunas da psicologia, vítima de ataques racistas no campus Umuarama, um convite para uma conversa, conforme print abaixo, retirado pela própria aluna:
Conforme declarado pela discente que forneceu o print, a estudante não foi informada sobre o local do encontro na pró-reitoria e, ao questionar sobre o local, não obteve resposta.
No dia 15 de março, organizada pelo Instituto de Psicologia (IPUFU), foi realizada a roda de conversa “Racismo na Universidade: vamos conversar?”. Na mesa, havia representantes da Seção Sindical dos Docentes UFU (ADUFU), DAPSI, Diretoria de Estudos e Pesquisa Afrorraciais (DIEPAFRO), SINTET-UFU e PROAE. Questionados pelos presentes sobre a possibilidade de formalizar a denúncia do ato racista cometido contra os estudantes de psicologia, os discentes Mateus Oliveira (representante do DAPSI) e Lucas Pires (discente de psicologia e técnico representante do SINTET-UFU), informaram que o grupo de discentes que foram vítimas de tal episódio estavam sendo acompanhados pelo DAPSI. Também foi informado sobre a postura dos discentes em não seguir com o movimento de evidenciar a violência que haviam sofrido, na tentativa de se preservarem.
Mesmo diante do que foi exposto na roda de conversa do IPUFU, a PROAE emitiu ao SINTET-UFU, à DIEPAFRO e à Diretoria de Comunicação da UFU (DIRCO), um despacho que, dentre outras providências, solicitava a identificação das vítimas envolvidas no caso do Umuarama. Para a DIRCO, foi demandado que esta solicitasse a identificação ao jornalista do portal G1 que havia realizado uma matéria com divulgação do caso, profissional que estava alheio ao que ocorria internamente na Universidade. CLIQUE AQUI E ACESSE O DESPACHO 45
Uma vez que a coordenação colegiada já tinha contato direto com os alunos que foram vítimas do caso Umuarama, era de ciência desta entidade sindical que a PROAE já tinha contato de telefone e nome de uma das vítimas, conforme print exposto anteriormente. Inclusive, não havia dado retorno a estudante para se encontrar com ela. Assim, não houve, para a coordenação colegiada o SINTET-UFU, fundamentos que justificassem a solicitação da PROAE. Além disso, forçar qualquer atitude para além do que a vítima está disposta, a submete uma revitimização. Por este motivo, o SINTET-UFU responde a PROAE no ofício abaixo, que foi enviado também ao DAPSI e ao IPUFU, instâncias que também possuíam contato direto com as vítimas, com o intuito de protegê-las.
Como resposta, o DAPSI envia uma carta que traz detalhes sobre o acolhimento feito pela entidade aos calouros que foram vítimas do constrangimento, bem como maiores detalhes sobre o contato que tiveram com os alunos. Segue:
Devido ao mesmo ofício, a DIEPAFRO convocou uma reunião entre o DCE, DIEPAFRO, PROAE e SINTET-UFU que foi marcada para o dia 28 de abril. Nesta reunião a PROAE sugeriu a instauração de uma comissão que pudesse elaborar um protocolo para acolhimento das denúncias de racismo no âmbito da Universidade que, após os casos de março, se multiplicaram na UFU. Segue a memória da reunião:
Como um pedido da PROAE, foi enviado um pedido de emissão da portaria de tal comissão pela DIEPAFRO, no dia 19 de maio. Segue ofício.
Ao final do mês de junho, dois fatos apontam estranhezas. A primeira delas é que as denúncias de casos de racismo que, conforme percebido anteriormente, se tornaram mais evidentes após as exposições dos casos de racismo nos campi Ituiutaba e Umuarama em março, deixaram de chegar na DIEPAFRO. Isso foi confirmado via ofício recebido pela unidade administrativa DIEPAFRO, em resposta a questionamento feito pelo SINTE-UFU em junho. Seguem ofícios por ordem de data.
O segundo fato, diz-se sobre a morosidade na emissão da portaria que oficializaria a comissão solicitada pela própria PROAE, que ainda não existia por vias oficiais mesmo após 40 dias após a indicação dos nomes pela DIEPAFRO. Devido a ausência de denúncias que também não chegavam, o SINTET dispara o seguinte ofício à PROAE, questionando quais procedimentos tem sido utilizados para apuração de denúncias.
Não houve nenhuma resposta da PROAE a este ofício emitido no dia 29 de junho até a elaboração deste texto, no dia 02 de agosto, mais de um mês após solicitação das informações.
Somada a estas situações, chegou até a nós uma resposta a uma manifestação enviada à ouvidoria da universidade. Nela, existiam uma série de indagações sobre a apuração dos casos de racismo na universidade e sobre os protocolos envolvidos. A resposta recebida à esta manifestação segue abaixo:
Esta resposta aponta incoerências. A ouvidoria sinaliza que os casos de racismo são apurados com acompanhamento das comissões permanentes das políticas de ações afirmativas da instituição. Todavia, a comissão permanente que trataria de assuntos raciais, instituída pela resolução 13/2018 do CONSUN, denominada como Comissão Institucional de Educação das Relações Étnico-Raciais (CEER), nunca foi oficialmente regulamentada. Após portaria para sua oficialização e trabalhos para construir seu regimento, que possibilita seu funcionamento efetivo, não houve nenhum movimento para que de fato pudesse operacionalizar. O regimento construído pelos membros foi entregue à PROAE em agosto de 2022 e ainda não foi reconhecida. Esta regulamentação esta parada no espaço do SEI da PROAE há um ano. O único movimento no processo que envolve a resolução e a comissão só foi realizado em maio deste ano, após as denúncias e outros vários acontecimentos relatados neste texto. Ainda assim, nada que trouxesse um encaminhamento efetivo para alcançar as problemáticas que temos enfrentado na instituição. A movimentação do processo 23117.003660/2020-92 que contém tais trâmites, demonstra o período em que este ficou parado:
Por último, expomos o resultado da denúncia de um caso onde um aluno expõe uma docente que, segundo declaração deste, o constrangeu de forma discriminatória e racista em sala de aula, o que teria sido gravado em vídeo por colegas de turma. Em post na rede do Instagram feito pelo Movimento Enfrente. Segue o post:
Fica o questionamento do porquê, diante tal materialidade, não houve um encaminhamento da gestão em instalar um Processo Administrativo Disciplinar para apuração devida dos fatos, uma vez que a ouvidoria não tem competência para apurar os fatos ou, ao que tudo indica, talvez não tenha também um aprofundamento sobre questões raciais para que possa distinguir o que realmente é ou não um constrangimento racial.
Tudo que é exposto aqui neste texto pretende, antes de tudo, sinalizar os mecanismos que acabam por perpetuar o racismo na estrutura das instituições. A morosidade da lida para construção de políticas antirracistas é algo extremamente grave e sinaliza, provavelmente, uma falta de vontade política da gestão da UFU. A maneira como os casos aqui expostos foram conduzidos, indica também a necessidade urgente de se construir um protocolo humanizado ne tratamento de denúncias de racismo.
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